Coisas do Coração

A doença e as descobertas da instintiva

Posted in Coração, doação de sangue by adilson borges on 9 de abril de 2009

 

Marilia em evento quando era presidente do CRESS-BA. Para a mulherada, eu não tinha nome. Era o "primeiro damo"

Marilia ( no centro) em evento quando ainda era presidente do CRESS-BA. Para a mulherada, eu não tinha nome. Era o "primeiro damo"

 

Jeane fazia caracol. Geraldo, camisa abotoada até o gogó. Cassandra parecia estátua, único sinal de vida vinha dos olhos castanhos. O busto de Márcia subindo e descendo compassado, mas sem parar, movimentos regulares, sem bip de doente. Perto da alta. Estava tudo normal no jornal. Aí  o telefone tocou no comecinho de dezembro de 2008:

 

– Boa tarde, senhor, queria confirmar sua consulta de cardiologia para a amanhã, 8h40…

– Desculpe, mas não marquei nenhuma consulta…

–  Está aqui marcada. Adilson Borges não é o senhor?

– Hum… Ah, já sei… Tá legal. Confirmada.

Havia uns 15 dias que Marília acordara com a idéia de que eu devia procurar um cardiologista para fazer check-up. Não adiantava argumentar que eu me sentia muito bem e que o exame periódico da empresa, todos os anos, incluía ecocardiograma. “Tem que ser um ‘cárdio’. Tome aqui o manual da AMS, o plano da Petrobras, e ligue, ok?” , dizia impaciente. “Ou então ligo eu, amore!”

O livrinho da empresa ficava no lugar onde deixava, eu esperando vencê-la pelo cansaço, contando com o monte de obrigações dela, como aconteceu da outra vez quando inventou este exame de rotina.  Não avaliei que, agora, a situação mudara. Ela ainda tinha o dia-a-dia duro da Petrobras, o curso MBA, custeado pela empresa, que a fazia a cada 15 dias ir sexta a São Paulo e voltar sábado, e outras viagens extras da rotina da estatal do petróleo brasileiro.

Tinha também a escola de Chico e o próprio, a quem, pelo menos acordado, acho que ela via menos do que eu – só na carreira da manhã, enquanto eu e ele quase todo dia almoçávamos juntos. Mas Marília Menezes Pessoa não era mais a presidente da 5ª Região do Conselho Regional do Serviço Social (CRESS- BA) e eu não precisava mais fingir que me incomodava quando a mulherada do Conselho, naquelas reuniões intermináveis, nos atos políticos ou nas farras com violão, me chamava de ‘primeiro-damo’.

A ‘sobra’ de tempo, talvez, fez minha instintiva, como um médico a chamou após a cirurgia, passar da ameaça à ação, marcando a consulta com uma cardiologista, Maria de Fátima Castro, que ela escolheu numa roleta russa: abriu o livrinho ao acaso e bateu os olhos na filha do saudoso jornalista Elmano Castro, fundador da Tribuna da Bahia.

Sem dor, com amor

Os exames ergonométrico e cintilográfico apontaram. E o categórico cateterismo (Ah quantos médicos corri em busca de algum que dissesse que não haveria necessidade!) feito pelo doutor Heitor de Carvalho, o “papa da hemodinâmica”, como já ouvi o chamarem, atestou irretorquível  a dimensão do problema. Sentindo-me muito bem, sem uma dorzinha qualquer, eu tinha uma artéria totalmente obstruída e as outras duas em níveis que variavam de 75% a 95%.

Assim, me internei em 16 de março (Ah quantos médicos, inclusive Heitor de Carvalho, corri em busca de algum que dissesse que meu caso poderia ser resolvido com angioplastia!), e no dia 17 fui operado pelo recomendadíssimo cirurgião Nilzo Ribeiro (nunca vi tanta unanimidade em torno de uma pessoa), no Hospital Aliança, onde fiquei até o dia da alta, 26 março de 2009, uma quinta-feira-feira de sol mais brilhante do que nesta opaca Quinta da Paixão que escrevo – renascido pelo amor e pelo instinto de Marília, que também me fez parar de fumar há 11 anos e acaba  de evitar, novamente por instinto, o progresso do aumento de  líquido no meu coração neste período pós-operatório.

Esta é outra história que conto depois.  Sei que prometi não fazê-lo, mas desculpe, minha comunista instintiva,  o “ex-primeiro damo” não pode esconder.

Obrigado, meu amor!

 

 

 

 

 

 

 

17 Respostas

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  1. Marcia Gomes said, on 9 de abril de 2009 at 19:22

    Eu só queria deixar bem claro que meu marido não gostou nada de ver meu busto citado no seu distinto (?) blog… Que fique registrado aqui meu protesto…

  2. adilson borges said, on 9 de abril de 2009 at 21:19

    Diga-lhe que seu busto foi citado com todo respeito que a ele devoto. Respeitosamente, me retrato

  3. Socorro said, on 10 de abril de 2009 at 09:01

    Oxente, Marília, deixa ele contar essas histórias. Porque elas podem ser úteis pra outras pessoas.
    Afinal, você é anjo-da-guarda. E dos bons…
    Ainda tem alguma dúvida, Adilson-quase-ateu, que eles existem?

    • adilson borges said, on 10 de abril de 2009 at 22:30

      Tenho todas as dúvidas do mundo e a certeza do bordão shakespeareano: “Há mais mistérilos entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia”

      • Wilson Gasino said, on 13 de abril de 2009 at 07:51

        Grande Adilson Borges. Belo blog. Bom saber notícias suas e saber que o seu coração-menino está firme, forte e (isto não é, de forma alguma, um paradoxo) sensível. Cuide bem dele. Forte abraço

      • adilson borges said, on 13 de abril de 2009 at 08:46

        Oh, Gasino, tava sentindo falta de sua sensibilidade neste espaço. Quanto a cuidar do coração, respondo com a frase que você usou às vésperas da cirurgia para me confortar e eu, de sacanagem, rebati: “Fique frio”.
        Um forte abraço.
        (não sei por que não apareceu o lugar específico , ao lado do seu comentário, para enviar resposta a você)

  4. jadson oliveira said, on 10 de abril de 2009 at 12:24

    Pois é, Adilson, às vezes é preciso uma circunstância especial pra gente saber dos velhos companheiros. Fiz o comentário abaixo no blog da Joaninha (graças a ela soube do amigo), não sei se vc viu, pelo sim, pelo não, transcrevo aqui. Dei uma olhada no seu blog (botei nos meus favoritos), só não gostei de ver o álcool relacionado como um dos causadores dos males do coração. Obrigado pelo “louco por sinceridade”.
    Não sei se vc sabe de mim. Há pouco mais de dois anos, deixei de trabalhar, vivo viajando – até agora, Cuba, Venezuela, Manaus, Belém, Palmas, Goiânia, Campo Grande, Curitiba, onde estou “morando” atualmente.
    Virei blogueiro e crítico radical da chamada grande imprensa (por razões políticas e ideológicas), mas deixei registrado no blog Mídia Baiana um elogio à primeira página de A Tarde do último dia 8.
    E continuo bebendo, com um pouco mais de moderação, forçado pela porra da idade.
    Um beijo, com ou sem viadagem, Jadson
    “Companheiro Adilson Borges, quanto tempo! Vc vem em minha memória, sempre associado ao velho Oldemar Vitor (“Por que é que todo caso de Adilson aconteceu anteontem?”, lembra?)
    Vi ontem a notícia de seu blog aqui em Joaninha e à noite sonhei contigo: vc estava todo empaletozado, de azul, alinhadíssimo, junto de um orelhão, bati no seu ombro e vc me recebeu friamente. Vc estava com uma filha de uns 10/12 anos, que estava te gozando por causa do voto do governador sobre o nome de teu blog (por sinal, gostei mais do que perdeu). Então, eu fiquei apoiando e instigando a garota, dizendo “é muito esnobismo mesmo…” E vc tentando justificar.
    Que tal?
    Quando saiu o recente acordo ortográfico, pensei, sacanagem, tiraram o hífen de infraestrutura, a lição que mais aprendi do professor Adilson.
    Como vê, muitas lembranças.
    E que porra de indumentária é essa da foto? Estavas na Europa ou na fria Curitiba?
    Um abração”

    • adilson borges said, on 10 de abril de 2009 at 22:42

      Comecemos pelo fim: a foto é de Bariloche, na Argentina.
      Belo sonho. Tem várias interpretações, uma delas é o que paletó tem significado de caixão, o famoso paletó de madeira, que me rondou; a filha, a consciência política, esta menina caprichosa.
      Mas como dizia Freud, às vezes, um charuto é só um charuto. Ponto final.
      Quanto ao álcool, o problema é o excesso. Uma tacinha diária faz bem para o corpo. E para a alma.
      É legal ver que você continua “louco por sinceridade”. Faz bem ao coração.
      Um beijo.
      Acabo de ler o midia baiana com o debate sobre a imprensa. Legal, mantenha contato. Quem sabe, um dia a gente volte a Seabra e a carinhanha, como naquela viagem fantástica, que realizamos há uns 20 anos. Para mim , foi marcante, sobretudo porque ali eu voltei a tocar violão.

  5. Hilcelia Falcão said, on 10 de abril de 2009 at 21:13

    Ops! O que seria dos homens se não fossem as mulheres…

    • adilson borges said, on 10 de abril de 2009 at 22:43

      O poeta fala por mim:

      “Não somos nada
      nunca seremos nada
      no entanto, temos todos os sonhos do mundo”.

      Um beijo, Hilcélia (saudade)

  6. Oldack Miranda said, on 12 de abril de 2009 at 10:56

    Caro Adilson,
    Bem-vindo ao clube. Há oito anos descobri que faltavam apenas 5% para entupimento total da artéria coronariana. Não entrei na faca, fiz angioplastia, coloquei dois stents. Agora soube pela coluna Tempo Presente, do Levi, que vc foi operado. Um abraço e melhoras. Já voltou ao trabalho? Quem faz safenas e mamária fica zerado.

    • adilson borges said, on 13 de abril de 2009 at 08:34

      Oh, velho Oldack. Quem bom saber que você está bem. Seu caso (não sabia e olha que foi há oito anos!) mostra como as doenças coronarianas avançam. Ainda não fez um mês que caí na faca, portanto ainda não fui liberado para o trabalho.Logo, voltarei. Um abraço

  7. Mariana said, on 13 de abril de 2009 at 07:59

    Querido Borges, que texto mais lindo! Marília realmente merece ter os pés beijados mil vezes. Quanto a vc, entrou de vez para o clube dos “dominados”, hehehe.
    Muito bom te ver bem e feliz, ao lado de Marília e de Chicão. Foi um encontro ótimo. Marquemos o próximo (com direito a jam session ampliada).
    Beijos.

    • adilson borges said, on 13 de abril de 2009 at 08:40

      Foi legal mesmo, Mariana! Não me lembro quando, sem tomar um tinto seco, passei uma noite tão agradável quanto aquela. Vamos à próxima. Novidade: acabei, domingo, de compor a música de Miriam, a enfermeira do sangue arterial, lembra? Estou com o jorro aberto.
      Quanto os pés de Marilia, beijo-os sempre. Já tou ficando preocupado com a coluna vertebral!

  8. isabel santos said, on 13 de abril de 2009 at 17:05

    Marília é mesmo seu anjo de guarda no plano terreno. Vacilar com a intuição da moça, jamais. Beijão pra vocês.

    isabel santos

    • adilson borges said, on 14 de abril de 2009 at 10:29

      obrigado, Isabel. outro beijão pra você. Quando quiser, ligue e apareça. Será um prazer

  9. Maira Carvalho Rios said, on 27 de fevereiro de 2010 at 01:53

    Oi Adilson ,
    Estou emocionada!!!
    É a 1ª vez que vi o seu blog , mas aproveito para me desculpar por não estar perto da minha amiga no momento que ela mais precisou , estava afastada do CRESS e não soube do seu problema de saúde…
    …Quando Marília me ligou disse que tinha estranhado eu não ter ligado , então fiquei mais arrasda ainda…
    Mas é isso aí , que bom que está bem!!!
    Vc é um homem de sorte meu amigo , tem do seu lado uma mulher de fibra , uma profissional competentissima e uma amiga maravilhosa. Gostaria de dizer que quando eu crescer quero ser igual a ela…rs
    Gosto de vcs de graça !!!
    Um beijão!!!


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